Jair de Ogum: Uma Vida de Dedicação e Superação Espiritual
Jair de Ogum nasceu em 21 de março de 1944, em São Paulo. Desde a tenra idade de sete anos, manifestou uma saúde delicada que exigia cuidados constantes. Sua mãe, Dona Ermelina, já exausta de levá-lo a inúmeros médicos sem sucesso, ouviu de uma vizinha sobre uma benzedeira chamada Sra. Tumásia Bendita de Souza. Nascida em 1859, Tumásia havia sobrevivido aos horrores da escravidão, servindo a seus senhores por 29 anos. Descendente de escravos da região de Denin, na África, ela era uma sensitiva e intermediava a passagem de entidades como Pai Benedito Carijó e Mãe Berlamina de Jesus, da linha dos Pretos-Velhos, entre outras.
Ao ver Jair entrar em sua casa de pau a pique, Tumásia logo afirmou que o menino não sofria de problemas de saúde, mas sim de mediunidade. Chamou-o para perto e, colocando a mão direita sobre sua cabeça, disse: “Salve Senhor Ogum!” Nesse instante, Jair caiu de joelhos incorporado pelo Ogum Rompe Mato, e assim nasceu Pai Jair de Ogum, sendo definido também como filho de Iemanjá.
Frequentando a casa de Dona Tumásia semanalmente, Jair começou a desenvolver sua mediunidade. Três anos depois, Tumásia solicitou a presença de Dona Ermelina e informou que Jair deveria fazer seu ronco (reclusão) por 40 dias para firmar sua cabeça. Inicialmente relutante, Dona Ermelina acabou aceitando ao ver a saúde do filho melhorar significativamente.
Jair então começou a dar passagem a outras entidades, tais como Arruda (Caboclo), Pai Icó (Preto-Velho), Marquinhos (Erê), Xangô-Pedra Branca, Marinheiro Iraí, Baiano Jesuíno Cruz e o Boiadeiro Chico do Chicote. Na linha da esquerda, ele trabalhava com o Exu Sr. Carangola, um empregado de Abaluaiê. Três anos depois, com o falecimento de Dona Tumásia, Jair e sua mãe sentiram-se desamparados.
Eles se mudaram da Rua Sebastião do Rego, no Ipiranga, para a Rua Capitão Militão, na Vila Santa Clara. Lá, fizeram amizade com o comerciante Sr. Miguel Bago, sua esposa Rosa e seus filhos, Michel, Toninho e Mari.
Dona Ermelina, preocupada com o desenvolvimento espiritual de Jair, soube de um centro Kardecista através de Dona Rosa. Ao visitar o local, descobriram que a diretora espiritual, Dona Helena Silva, dava passagem a três entidades: Jorge Elói, Pai José Canta Galo (Preto-Velho) e Chefe Relutante (Caboclo). Jair frequentou as sessões dominicais deste centro, mas sem grandes mudanças em sua situação espiritual.
Jair então conheceu Neusa, sua futura esposa, que inicialmente não aceitava o espiritismo. Após entender que muitos dos problemas em sua vida tinham raízes espirituais, Neusa passou a frequentar e trabalhar no centro de sua mãe, Dona Tomazina, conhecida na umbanda como Mãe Gina. Com o tempo, Neusa firmou sua cabeça e se tornou Neusa de Iansã.
Dada a limitação de espaço da tenda de umbanda Caboclo Cobra Coral, Jair decidiu abrir seu próprio terreiro. Sem recursos, escolheu uma clareira na mata de Ribeirão Pires, onde realizava seus atendimentos em céu aberto todas as quartas-feiras, independentemente do clima. Aos 23 anos, Jair casou-se com Neusa, que o acompanhava nos trabalhos na mata.
O irmão de Jair, Roberto Verner, ofereceu-lhe o quintal da sogra para abrir um centro, e após muita relutância, Jair aceitou. Assim, estabeleceu sua casa de umbanda na Av. Humberto de Alencar Castelo Branco, 184, onde construíram um espaço simples. O local, entretanto, sofria constantes inundações pelo rio Piraporinha, mas o casal perseverou em sua missão.
Dona Tomazina (Mãe Gina), com a saúde debilitada pela idade, pediu a Jair e Neusa que continuassem seu trabalho espiritual após sua morte. Com o falecimento de Dona Tumásia, houve a fusão dos dois terreiros, criando o Centro de Umbanda e Quimbanda Sr. Carangola e Sr. Tranca.
Desde 1963, o centro realiza obras de caridade e atualmente possui sede própria em São João Clímaco, na Rua Floresta Clube, 199. Inicialmente modesta, a sede passou por reformas e ampliações financiadas pela criatividade do casal, que produzia e vendia ovos de Páscoa. A arrecadação desses esforços foi destinada às melhorias do terreiro, que hoje é considerado o maior terreiro de Umbanda em área construída.
Agradecemos à Dona Tumásia, que Deus a tenha. Nossa gratidão a Dona Tomazina Toesca dos Santos (Mãe Gina), minha sogra, e à minha mãe Dona Ermelina por sua perseverança. Também agradecemos à família Bago e aos nossos filhos Joca, Regina e Lu, pela coragem, determinação, dedicação e suporte. Dedicamos nosso trabalho à humanidade e aos nossos filhos de fé, especialmente às nossas herdeiras espirituais: nossa filha Valéria de Oxum, nosso genro Rogério e nossa neta Érica de Ogum.
“Ninguém desaparece quando morre. Viver com dignidade e morrer com dignidade deveriam ser tesouros cobiçados ansiosamente. Nunca poderemos ser uma ilha na Humanidade, somos uma única espécie. Deveríamos amá-la e cuidar mutuamente, caso contrário não sobreviveremos.” – Augusto Cury